segunda-feira, 19 de agosto de 2013

De bandeja

Está acima do peso. Sabe disso. Jaleco verde aberto até o último botão, deixa à mostra uma blusa de cóton. Justa. Branca. Quase transparente. Vergonha pelo excesso de gordura nos quadris fica para lá! Até se acha interessante mesmo equilibrando a sobrevivência entre as mesas. É um quiosque à beira-rio. Quase nove-da-noite. Quase ninguém. Vai trabalhar até "Deus sabe quando".
É mulher apaixonada. Amorosa. Sexualmente ativa e fogosa.
Sua relação não é atípica. Sabe, entre servir uma cerveja (nem tão gelada, é bom citar!) e beber um copo d´água, que o "cafajeste" é sujeito esponjoso. Do tipo "parece-um-canalha/me-faz-feliz". Ele a troca facilmente por qualquer conversa de boteco.

Tevê no 20. Quarta-feira, nove e quarenta da noite. Horário padrão. E patrão de sua leveza, de sua diversão; da paixão... da nobreza!
O time entra em campo.
A mulher chega, vê a cena, e pega no sono. É instintivo.
Conversa com o travesseiro.
 - Ele não tem outra - resmunga o ciúme. E não tem mesmo. Não tem rabo-de-saia adolescente. Não tem a tentação porta-de-escola.
Até parece isso. Mas é puro instinto masculino.

- Homem que é homem gosta de futebol - , firma-se esparramado na cadeira de plástico que ganhou em dívida de sinuca. Nem olha para o quarto. Nem pisca.
- Só vou tomar a penúltima e já volto - , murmura sozinho, enquanto fecha lentamente a porta da sala crente que ninguém o percebe. Nem deixa um bilhete sequer.

É naquele barzinho, cem metros de casa, a quase desgraça da relação. O alívio do dia-a-dia.
A tentação mordaz.
Foi para lá no intervalo do jogo.
Chegou até o chefe da mulher que, sozinho assistia, pálido, a derrota do time de ambos.
Apito final, resultado adverso. Nem ligaram. Estavam já na quinta garrafa. E beberam mais seis. Buscaram a última.
- Quem já está em onze, completa logo meia-caixa - , bebericou o marido da garçonete.

Ficaram até três e quinze no bate-papo "futebol-dinheiro-desilusões-mulheres".
Volta quase às quatro. Puxa o cobertor bem de leve, quase denunciando um crime inafiançável. Ela percebeu. Abriu os olhos, sentiu a catinga-de-cachaça. Nem olhou para o lado. Está acostumada. Não falou nada.

Dia seguinte, o patrão, inocente, comenta a bebedeira.
Sorriso nos lábios, trabalha faceira. Louca para chegar na cama e encontrá-lo de novo, de qualquer jeito.