quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Onde dobra o vento

Cantão beira de rio guarda histórias;
Bêbados, grávidas, cadeirantes...
Gente que não cabe nas memórias;
E que sobrevive só em partes.

Perambulam trôpegos os de ranço local;
E passageiros também, de todo tipo.
Há quem olhe indiferente e até igual;
Os de contornos e aqueles que antecipo.

Mau humor percorre o ambiente, sim;
Algum sorriso sincero, até embaraço.
Aparece semblante perto do fim;
E alma nova que alivia o cansaço.

sábado, 11 de agosto de 2018

Som da oração

Se me prestar a orar,
Que o poema seja amar.
O som luta, não trai;
Meu teclado me distrai.

Cozinho,
Sozinho.
Meu vinho,
Meu moinho.

Acho que preciso dormir;
Acho que preciso ir.

Se me armar a lutar,
Que o lema seja remediar.
O som brota, não cai;
Meu alambrado me contrai.

Cozinho,
Sozinho.
Meu vinho,
Meu moinho.

Acho que preciso dormir;
Acho que preciso ir.

Se me parar a pensar,
Que o tema seja aperfeiçoar.
O som encosta, não extrai;
Meu refugado me descontrai.

domingo, 29 de julho de 2018

Fiquei eu

A gente se aproxima da via láctea e do fundo do mar
E percebe que se afastar e odiar é quase igual a amar.
A rouquidão se confunde com largo e sincero sorriso;
O que não tolero, meu bem, é só o que não preciso.

Por cima de nosso recheio sobram sabor e encanto,
E o que não é definitivo, se basta por enquanto.
Quase toda despedida tem um final perto de feliz,
Ficam som e gosto da esperança até do que não se diz.

Ah, o travesso travesseiro acalma sempre todo o dia,
E traz a inquietude também até do que eu não queria.
Pouco adianta, etilicamente, lamentar as certezas,
E emendar os pontos de interrogação das sutilezas.

Vou apreciar o que restou desbotado desse vermelho,
E conferir se ainda reflito só e sozinho no espelho.
Se não me achar, contente que a imagem de mim valeu,
Terá sobrado o que restou; apenas à sombra, fiquei eu.


sábado, 7 de julho de 2018

Amargor

Não, não sei dizer o que sinto:
E se falto com a verdade ou minto.
Se é tão simples assim
E se tem um simples sim.

Não, não é somatório de números;
E nem do que são os acúmulos.
Se é tão emoção ou percussão,
E se tem razão ou ação.

Não, não sei fazer contas;
E nem se faltam meias ou pontas.
Se é tão caída de Neymar
E se difere paixão de amar.

Sim, sim para além de mim;
E para quem distorceu, enfim.
Se é tão Alemanha ou Bélgica
E se Copa aqui ou da Rússia.

Sim, sim para o que faltou;
E nem tampouco para o que ficou.
Se é discurso ufanista do Tite
E se a gente ainda resiste!

Somos nós na Copa

Seis e doze, seis e treze da manhã. O vermelhidão do céu beija a janela do banheiro. Penso ser um sinal de sol, de dia quente. Logo, logo, o relógio marca: faltam menos de nove horas para a Seleção Brasileira entrar em campo. Oh, será contra a Bélgica, o país que mais fala francês, fora a França, no mundo. “Au revoir” significa, na tradução livre, adeus. Contra nossos rivais de bola e irmãos de continente, os franceses passearam logo cedo: 2x0, fácil, nos uruguaios.

Ainda restava a lembrança dos raios solares. Quinze, quatorze minutos antes de a bola rolar, estava eu fígado em prantos e toalha verde a enrolar, cintura abaixo, o que sobrou de mim da noite anterior. Resgatei uma camisa cinza, tida como “a da sexta-feira”, por conter mensagem otimista. Estiquei-a em direção ao mais pessimista dos três filhos. Restou um vácuo de comoção e a esperança no amarelo-e-amarelo do solzinho estampado.

Passos largos, seguimos: eu, a camisa e o filho. Fomos ao mesmo boteco dos dois jogos anteriores. Bacana, emotivo e numerólogo. Ficamos, a princípio, longe da tela. Logo, logo, o dono do estabelecimento nos restaurou à mesa dois, simbólica e ocupada por nós nas duas últimas vitórias por... 2x0! Tinha só um ingrediente novo: um senhor instalado previamente, que se fez nosso parceiro de corpo, copo e alma.

A intervenção de Sidney, proprietário do bar, promoveu o entrelace de operários da comunicação. João Batista, o “Batistinha”, degustava uma Skol em taça de alumínio e relembrava os tempos de Aloísio Parente e Pessanha Filho, entre outros, ao microfone da extinta Rádio Cidade, do folclórico slogan: “No meio é melhor; ligue Rádio Cidade, o som maior...”. Ponderei o tom erótico da vinheta, rebatido com o argumento do centro do dial.

Cabelos brancos e bom de lábia, “Batistinha” me encantou. Papo vai, papo vem... Bélgica 1x0! Gol contra de Fernandinho. Não lamenta e não inventa, rima tão pobre quanto clássica radiofonicamente! Eu, ex-comentarista esportivo, entre outras coisas, digo que Fernandinho e Gabriel estavam mal posicionados. Jesus!!! Não deu tempo para goladas a mais e o loirinho De Bruyne coloca água na nossa loira gelada – a minha e a do (já!) incrédulo “Batistinha”.

Veio o segundo tempo e pedi o mesmo tira-gosto dos jogos passados. Faltou, concluí, sabor à Seleção. Renato Augusto, quem diria, entrou. E “quem diria, parte 2”, fez gol. “Quem diria, parte 3”, de cabeça, na altíssima defesa adversária. Não adiantou Tite, professor de si mesmo, mudar o time. Ficamos a um gol de tentar seguir na Copa. Símbolo Augusto! Demos bandeira, com o amargo sabor do chocolate belga. “Au revoir”, despediu-se o sábio “Batistinha”!

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Não tem preço

Vou pagar meus pecados de ré,
Para não ser cobrado pela fé.
Se a moeda anda na frente,
Retroajo no passo seguinte.

Mesmo no drible, na contramão,
Peço a Deus uma gota de perdão.
Oro e clamo pelos vendilhões,
Que alugam os próprios culhões.

Sei que sabem bem o que fazem;
Desprezam, enriquecem e maldizem.
Não desejo que finquem na cruz;
Mediocridade não se reproduz.









segunda-feira, 5 de março de 2018

Azul da alma

Goyta dos gols da Formosa e da Saldanha
De Tonico, de Amarildo e de Lukinha
Da matemática e da filosofia
Do bom humor e da ironia

Goyta de títulos, de troféus e vencedor
Da mulher, do homem, do torcedor
Da criança e do aposentado
Do doutor e do descamisado

Goyta da vida, da história e do amor
Do grito alto, do abraço e do louvor
Do arco e flecha, de reis e plebeus
Goyta cor do céu, Goyta de Deus