terça-feira, 9 de julho de 2024

Ninguém apostava

Clóvis vestia a oito.

E desfilava.

A origem germânica do nome contrastava com a pele negra.

Mas ele superava qualquer preconceito. 

E bailava.

Sim, Clóvis era um bailarino da bola.

Anônimo.

Invisível. 

Até que...

Na noite de 19 de março, do longínquo 1986, se fez brilhar.

Naquele dia os holofotes eram para o badalado Fluminense.

Eram!

Porque Clóvis mudou o rumo da luz.

A chamou pra si de forma leve, carinhosa. 

Como os que muito amam.

E essa relação íntima ele teve com a bola.

Ela era cheia de tricolores e tricolices.

Tricolices, termo diferente, é só pra rimar.

Rimar com tolices de um grande time, super campeão, emperrado.

Amordaçado. 

Empacado por Clóvis, o gênio de uma noite mágica. 

Ele ditou o ritmo. 

Cadenciou o samba.

E sambou, bailarino, a nota que inventou.

Deu dó num Fluminense de ré.

Foi mi, foi fá, foi o sol reluzente de um lá dia mágico em si.

Regeu uma orquestra afinada por Sena.

Sim, Sena, não o piloto, mas o guia dos gols.

Fez o primeiro, já veterano. 

Antes, jovenzinho nascido na terra do conhaque, deixou São João da Barra pra trajar uniformes do Palmeiras e do Bahia.

Jogou até no Atlético de Madrid.

Mas domou o touro, mesmo, foi junto com Clóvis, autor de um golaço de cobertura. 

O ponta Leandro fez os outros dois do inacreditável 4x0.

Naquele 19 de março, em que uma improvável zebra deixou o maioral do Rio de joelhos. 

O Globo Esporte registrou. E relembrou (olha o vídeo aí, no final do texto). 

De lá pra cá a luz apagou.

O azul desbotou.

De Clóvis não se teve mais notícia. 

Leandro sumiu.

Sena vive no interior. 

E o Goytacaz sucumbiu. 

Chegou à quarta divisão estadual. 

Quase parou.

Quase, porque a torcida, firme e guerreira, destituiu a diretoria. 

E assumiu as rédeas de um clube que já deixou o atual campeão da Libertadores de quatro. 

O "Azul da Rua do Gás" está longe de repetir tal façanha. 

Milagre, agora, é sobreviver. 

Mas que ninguém duvide de um clube que, um dia, deu show com Clóvis, Sena e Leandro. 

Porque foi bonito.

Iluminado.

Poético, até. 

E a gente não duvida que o futebol é poesia.

Aposte nisso.

 

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